sábado, 30 de outubro de 2010

Sol, lua e estrela


Quando a lua chega
De onde mesmo que ela vem?
Quando a gente nasce
Já começa a perguntar,
- Quem sou? Quem é?
- Onde é que estou?

Mas quando amanhece
Quem é que acorda o sol?
Quando a gente acorda
Já começa a imaginar
- Pra onde é que vou? Qual é?
- No que é que isso vai dar?

Quando a estrela acende
Ninguém mais pode apagar
Quando a gente cresce
Tem o mundo pra ganhar
- Brincar, dançar, saltar
- Correr, meu Deus do céu.
- Onde é que eu vim parar?


Sandra Peres e Alice Ruiz

sábado, 23 de outubro de 2010

"MISTÉRIO"


Gosto de ti, ó chuva, nos beirados,
Dizendo coisas que ninguém entende!
Da tua cantilena se desprende
Um sonho de magia e de pecados.

Dos teus pálidos dedos delicados
Uma alada canção palpita e ascende,
Frases que a nossa boca não aprende,
Murmúrios por caminhos desolados.

Pelo meu rosto branco, sempre frio,
Fazes passar o lúgubre arrepio
Das sensações estranhas, dolorosas…

Talvez um dia entenda o teu mistério…
Quando, inerte, na paz do cemitério,
O meu corpo matar a fome às rosas!


Florbela Espanca

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Soneto do amigo


Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.

É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.

Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...


Vinicius de Moraes

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Poema da malta das naus



Lancei ao mar um madeiro,
espetei-lhe um pau e um lençol.
Com palpite marinheiro
medi a altura do Sol.

Deu-me o vento de feição,
levou-me ao cabo do mundo,
pelote de vagabundo,
rebotalho de gibão.

Dormi no dorso das vagas,
pasmei na orla das praias,
arreneguei, roguei pragas,
mordi peloiros e zagaias.

Chamusquei o pêlo hirsuto,
tive o corpo em chagas vivas,
estalaram-me as gengivas,
apodreci de escorbuto.

Com a mão esquerda benzi-me,
Com a direita esganei.
Mil vezes no chão, bati-me,
outras mil me levantei.

Meu riso de dentes podres
ecoou nas sete partidas.
Fundei cidades e vidas,
rompi as arcas e os odres.

Tremi no escuro da selva,
alambique de suores.
Estendi na areia e na relva
mulheres de todas as cores.

Moldei as chaves do mundo
a que outros chamaram seu,
mas quem mergulhou no fundo
do sonho, esse, fui eu.

O meu sabor é diferente.
Provo-me e saibo-me a sal.
Não se nasce impunemente
nas praias de Portugal.


António Gedeão

sábado, 9 de outubro de 2010

Quero teus beijos...


Quero teus beijos
Beijos em forma de poemas,
Daqueles que tudo dizem.

São lábios unidos, gulosos.
Porém de bocas ocupadas,
Pois nada precisam dizer.

Num abraço em forma de laço,
Lábios ávidos se encontram.
Transmitem um misto de sentimentos,
Ternura, paixão, desejo e amor...

Então não diga nada.
Apenas me beije muito, muito.
E assim, com os lábios unidos,
Fazemos um lindo poema de amor.

Então beija-me!


Joe Luigi

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

NOUTRO LUGAR

Abre a janela do coração
e deixa que a madrugada
o tome por inteiro.
Não tenhas medo.
Não faças nada,
senão isso primeiro.


Depois debruça-te e espera.
Hás-de ouvir a voz do mar,
vinda no vento, como era
outrora, noutro lugar.


Verás então que nada está perdido
e a vida recupera o seu sentido.


Torquato da luz