quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Fugaz


Passagem por uma paisagem,
lugar do onde, do ontem, do quando,
quantas palavras ficaram faltando
na boca cheia de imagens.
O outro é aquele que ficou à margem,
no espanto de um pronome,
no corpo de uma brisa suave;
o outro é como uma fome
pluma à deriva, à distância, ou quase.

Estranho em sua própria viagem,
garrafa com uma mensagem,
olhar durando numa flor,
sem nome, secreta, selvagem.

Desterro, água bebida num trem,
peça incompleta, festa adiada, vertigem,
a cabeça sempre em alguém,
eu outro, eu todos, ninguém.

Rodrigo Garcia Lopes

O HOMEM DA NEVE


É preciso uma mente de inverno
Para olhar a geada e os ramos
Dos pinheiros cobertos pela nevada

E há muito tempo fazer frio
Para observar os zimbros arrepiados de gelo,
Os abetos ásperos no brilho distante

Do sol de janeiro; e não pensar
Em qualquer miséria no som do vento,
No som de umas poucas folhas

Que é o som da terra
Cheia do mesmo vento
Que sopra no mesmo lugar vazio

Para alguém que escuta, escuta na neve,
E, ausente, observa
Nada que não está lá e o nada que é.

WALLACE STEVENS

CIRANDA


Meu coração andarilho
Vagou por tanto caminho.
Tanta curva, tanto trilho,
Tanta rota em desalinho.

Tanta luz de pouco brilho,
Tanta flor de muito espinho.
Tanto beijo maltrapilho,
Tanta cama sem carinho.

Tanta gente ao derredor,
Tantas vezes eu tão só
Te chamei desesperado.

Até que num belo dia,
Fez-se a mais louca magia
E eu acordei do teu lado...

Jenário de Fátima

SAUDADES


Olho à volta
e não te vejo!
nem a penumbra
nem o ensejo
nem uma asa no horizonte
A distância é
um compasso na curva do meu abraço
A distância é tão longe!
Tão longe que perde a esperança
no cansaço de cada dia, na cruz do alvorecer!
Vou embora de mim, vou ser monge
num retiro do Tibete vou reaprender a Ser
dona da minha vontade
Deitar fora esta Saudade
que me está suicidando
Olho à volta... não te vejo
nem a penumbra, nem o ensejo
Nem uma asa no horizonte
Minha boca é uma sede! minha alma é uma fonte!

Luiza Caetano