quarta-feira, 23 de setembro de 2009


Não sei onde estás, se falas
ou se apenas olhas o horizonte,
que pode ser apenas o de uma
parede de quarto. Mas sei que
uma sombra se demora contigo,
quando me pergunto onde estás:
uma inquietação que atravessa
o espaço entre mim e ti, e
te rouba as certezas de hoje,
como a mim me dá este poema.

(Nuno Judice)

Se eu pudesse guardar os teus sentidos


Se eu pudesse guardar os teus sentidos
Numa caixa de prata e de cristal,
Entre conchas do mar, búzios partidos,
Pequenas coisas sem valor real...
Se eu pudesse viver anos perdidos
Contigo, numa ilhota de coral,
Para além dos espaços conhecidos,
Mais longe do que a aurora boreal...
Se eu soubesse que o olhar de toda a gente
Te via, por milagre, repelente,
Que fugiam de ti como da peste...
Nem assim abrandava o meu ciúme,
Que é afinal o natural perfume
Da flor do grande amor que tu me deste.


(Reinaldo Ferreira)

VÉUS, VÔOS E AVESSOS


Quando amo plenamente
abro os portais da alma
sem medo de me lançar
ao alizarim, ao azul
arrisco a entrega inteira
sem temer vôos ou quedas
vislumbro o céu e o avesso
nos olhos descortinados
vejo verdes, lilases, anis
cor-de-noite, terra, gris
janelas abertas, paraísos...
Coração leve, apaixonado
livre dos véus da ilusão
avança no vazio violeta
inventa novos jardins
revive entre nuvens e luzes
ultrapassa limites, cintila
num trânsito eterno-etéreo...

(Ana Luisa Kaminski)

Enquanto houver uns olhos que reflectem
outros olhos que os fitam,
enquanto a boca responda a suspirar
aos lábios que suspiram,
enquanto sentir-se possam ao beijar-se
duas almas confundidas,
enquanto exista uma mulher formosa,
haverá poesia!


(Gustavo Adolfo Bécquer)

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Meu amor, meu amor, é Primavera!


É Primavera agora, meu Amor!
O campo despe a veste de estamenha;
Não há árvore nenhuma que não tenha
O coração aberto, todo em flor!

Ah! Deixa-te vogar, calmo, ao sabor
Da vida... não há bem que nos não venha
Dum mal que o nosso orgulho em vão desdenha!
Não há bem que não possa ser melhor!

Também despi meu triste burel pardo,
E agora cheio a rosmaninho e a nardo
E ando agora tonta, a tua espera...

Pus rosas cor-de-rosa em em meus cabelos...
Parecem um rosal!
Vem desprendê-los!

Meu Amor, meu Amor, é Primavera!...


Florbela Espanca

Hino à Primavera


Esses campos verdejantes
que percorremos a eito...
Já não são o que eram antes,
fazem-nos abrir o peito.
Deles rebentam flores
de várias tonalidades...
crescem com elas amores
e algumas amizades.
O cantar dos passarinhos
dá nova fisionomia.
Dá-nos festas e carinhos
e também dá alegria.
O chocalhar dos chocalhos
do gado que anda a pastar...
É uma linda melodia
que nos incita a amar.
O cheiro que a terra deita
é cheiro entontecedor,
tal qual como quem espreita
o despertar do amor.
Esses campos verdejantes,
são mais lindos, mais dourados,
são o lugar dos amantes e de muitos namorados.

(Fernando Fitas)

Doce tormento


Sentimento bandido
Gasta meu tempo
Ocupa minha mente
Noites sem fim
Agonia e extase,
Sempre foi assim
Cravado no meu peito
Parece não ter fim
Você me ignora
E ainda devora
O que sobrou de mim,
Mas ainda sou sorriso,
Esperando teu riso
Enquanto aguardo meu fim.


Betânia Uchôa

domingo, 20 de setembro de 2009

Beijos guardados no baú...


Guardo teus beijos num baú
Eles são minha razão de existir
Por vezes vou lá buscar um
Porque me é difícil resistir

São o bem mais precioso
Que me acalenta o coração
Esses beijos de amor gostoso
Que saboreio com emoção

O baú, deles está repleto
E quando lá vou, vou feliz
Roubar um beijo indiscreto

P’ra meu amor calar o desejo
Senão, ficará infeliz
Por teus lábios, que tanto almejo


**Fernando Ramos

O Ser ou o Desequilíbrio


Será o ser algo desdobrável
Ou incorruptível ao ponto único
De não ter mais nada em si
Do que a própria estrutura de ser?
E assim se o ser puro
Na sua essência , que a mesmo tempo
É e existe, nula e vaga?
Ou terá ele enchimentos?
Metamorfoses, como disse heráclito,
Que o tornam impuro e maleável,
Nunca o mesmo, mas sempre o ser,
Nunca eterno, apenas temporal,
Mas infinito na sua transformação.
Constante no seu desequilíbrio.
Como será enfim?
Pois ainda não há
Metafísica bastante que o explique…


Clóvis Brondani

Entre O Sono E Sonho


Entre o sono e sonho,
Entre mim e o que em mim
É o quem eu me suponho
Corre um rio sem fim.
Passou por outras margens,
Diversas mais além,
Naquelas várias viagens
Que todo o rio tem.
Chegou onde hoje habito
A casa que hoje sou.
Passa, se eu me medito;
Se desperto, passou.
E quem me sinto e morre
No que me liga a mim
Dorme onde o rio corre -
Esse rio sem fim.


Fernando Pessoa – Cancioneiro

sábado, 19 de setembro de 2009

LEIA-ME!


Entre quatro paredes estou
imersa em meus pensamentos...
Cada canto tem um verso
que eu compus só pra voce!...
Cada linha, cada rima
é a expressão do que sinto...
Junte tudo com muito cuidado
Leia-me com todo carinho
E entenderás o meu amor!

(Denise Flor)

A Mulher


Ó Mulher! Como és fraca e como és forte!
Como sabes ser doce e desgraçada!
Como sabes fingir quando em teu peito
A tua alma se estorce amargurada!
Quantas morrem saudosa duma imagem.
Adorada que amaram doidamente!
Quantas e quantas almas endoidecem
Enquanto a boca rir alegremente!
Quanta paixão e amor às vezes têm
Sem nunca o confessarem a ninguém
Doce alma de dor e sofrimento!
Paixão que faria a felicidade.
Dum rei; amor de sonho e de saudade,
Que se esvai e que foge num lamento!


Florbela Espanca

Canção do amor imprevisto


Eu sou um homem fechado.
O mundo me tornou egoísta e mau.
E a minha poesia é um vício triste,
Desesperado e solitário
Que eu faço tudo por abafar.

Mas tu apareceste com a tua boca fresca
De madrugada, com o teu passo leve,
Com esses teus cabelos...

E o homem taciturno ficou imóvel, sem
compreender nada, numa alegria atônita...

A súbita, a dolorosa alegria de um espantalho
inútil aonde viessem pousar os passarinhos.


Mário Quintana

Libida Fantasia


Namoramos o mar, solitários com a Lua
Sentindo a brisa, que nosso rosto acaricia...
Olhando o brilho de prata, que nos desafia
Ao desejo de fundir, minha boca na tua!

Oh brilho encantado, que no prazer nos flutua
Fazendo despir a roupa e a timidez que havia...
Mergulhando nas águas e nosso amor se unia
Soltando todos segredos ao mar, de alma nua!

As águas embalava, nosso amor que ardia,
Fogo em prata, de tanto desejo sonhado
Nesse mar, que a intimidade escondia,

O mais libido ardor... tão apaixonado
Que excitados, de tanto amor se perdia
Por entre o mar e o brilho do Luar encantado!


Loucopoeta

NÃO ME ESQUEÇAS


Por favor, não me esqueças,
Só porque o mundo gira e rola,
As aves evadem-se para Norte
E as flores recolhem-se, no silêncio..
Por favor, não me esqueças,
Nem quando a lua se esconde, no céu,
E as nuvens viajam, clareadas,
Na noite que desce sobre nós.
Por favor, não me esqueças,
Até que eu chegue ao sol poente
E me volte para ti, acenando,
Suba o arco-iris, cantando,

E desapareça na névoa e no mar..
Só, então, sim, tu podes, tu deves
Esquecer-me. Não serei mais
Que uma onda de espuma
Banhando a areia.

ILona Bastos

Bilhetes


Alguns escrevem pela arte,
pela linguagem,
pela literatura.
Esses, sim, são os bons.
Eu só escrevo para fazer afagos.
E porque eu tinha de encontrar um jeito
de alongar os braços.
E estreitar distâncias.
E encontrar os pássaros:
há muitas distâncias em mim
(e uma enorme timidez).
Uns escrevem grandes obras.
Eu só escrevo bilhetes para escondê-los,
com todo cuidado,
embaixo das portas.

Rita Apoena

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

COISAS NOSSAS


Esta manhã é minha, esta manhã é sua.
Respire fundamente esse ar tão leve e frio
que vem ali da praça e que atravessa a rua
e vai levando as folhas para o meio fio.

Venha à porta comigo e veja que flutua
a nuvem cuja forma diz que está no cio.
Abraça-me em silêncio e no silêmcio frua
essa nossa manhã - longa manhã de estio.

Depois vamos sair que a vida nos espera.
O dia vai passar e é bom que enquanto passa
lembremos da manhã - o que nos retempera.

E depois, ao voltar, a gente se adivinha,
pois indo olhar lá fora um ao outro se abraça
nesta noite que é sua, neste noite que é minha...


Théo Drummond

O LADO BOM


Quero ser uma ilha,
um pouco de paisagem,
uma janela aberta,
uma montanha ao longe,
um aceno de mar.

Quando precisares de sonho,
de um canto de beleza,
de um pouco de silêncio,
ou simplesmente
de sol... e de ar...

Quero ser o lado bom
em que pensas,
isto que intimamente
a gente deseja
mas nem sempre diz
- quero ser, naquela hora,
o que sentes falta
para seres feliz...

Que quando pensares
em fugir de todos
ou de ti mesma, enfim,
penses em mim...


J. G. de Araújo Jorge~

Pelo horizonte de areias


Pelo horizonte de areias,
 reclina-se a voz do canto.
 A moça diz muito longe:
 "Eu sou a rosa do campo..."

 O beduíno para e escuta,
 vestido de pensamento,
 sozinho entre as margens de ouro
 do ar e do deserto imenso.

 "Eu sou a rosa do campo..."
 E olhando para as ovelhas
 sente o chão verde e macio
 e flores pelas areias.

 "Eu sou a rosa do campo..."
 Mas tudo o que ouve e está vendo,
 é poeira, apenas, que voa:
 o vento da voz ao vento.


Cecília Meireles

Momento de abstração!


Quisera partir numa nuvem
Com a alma pura,
Com a alma terna,
Com a alma bela.
E suspensa pairar
sobre o tempo, sobre a esfera
Mergulhar no céu imenso
E longe de mim e do mundo, Sonhar.
Pairar sobre calmarias
Apartada de tormentas,
Abraçar gentis quimeras,
Embalar, terna, a esperança,
E alcançado o infinito
Planar por entre as estrelas
Embeber a alma nelas
E continuar a Sonhar.
E que o dia e a noite juntas
Vestissem o horizonte
E salpicassem o Sonho
De cores ternas,
De cores quentes,
De cores eternas.
E o Sonho fosse uma tela.

(Amina - Paula M)

Campo de sucatas


Saudade do futuro que não houve
aquele que ia ser nobre e pobre
como é que tudo aquilo pôde
virar esse presente podre
e esse desespero em lata?

pôde sim pôde como pode
tudo aquilo que a gente sempre deixou poder
tanta surpresa pressentida
morrer presa na garganta ferida
raciocínio que acabou em reza
festa que hoje a gente enterra

pode sim pode sempre como toda coisa nossa
que a gente apenas deixa poder que possa


Paulo Leminski

A Razão do Poema


Do que é feito o poema?
Barro de essência invisível?
Nuvem de tons arcoirizados?
Elementos dispersos,
Pelo poeta magnetizados?
Ou densa identidade
de expressão incontida?
O poema é amante,
Sentimento levitante
Viagem santa e atrevida
Pulso de um sonho em prece
Aborto, parto, nascente.
O poema é só palavra
E o poeta: inconseqüente...
 

Eurídice Hespanhol

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

A saudade voa no espaço sideral


Versos embebidos de saudade
Dos momentos de felicidade.
Letras que exprimem a dor;
E retrata o que sente o interior.

Versos que formam a poesia.
Pinta a dor ou a magia.
Sofre e ama acompanha os fatos;
Felizes ou ingratos.

Versos formados na alma
Que alivia produz calma.
Passa e entrelaça todos os sentidos.
E nova mensagem afaga os ouvidos.

Versos de amor e encanto
No céu azul voa e colhe o pranto.
A saudade bilateral;
Voa no espaço sideral.

Versos se encontram nos ares
O coração verseja formam pares;
Revela que ama e sofre pela saudade.
Marcam encontro e exultam de felicidade.


Hortência Lopes

“APRENDENDO A VERSEJAR”


Procuro por alguém
Que me ensine a versejar...
Quero escrever um poema,
E a ti ofertar...

Não quero ser poeta,
Muito menos escritor...
Mas escrever algumas linhas,
Para demonstrar meu amor...

Não sei quanto tempo
Vou demorar em escrever...
Mas será especial,
E gostoso de ler...

Estou certo deste amor
E de ninguém vou esconder...
Publicarei em jornal,
Assim que aprender...


RAUL DIAS

*Sou Assim*


A constante espera do acerto
o defeito da busca de mais,
o confronto de tudo; inexato...
sou o fato fugindo dos ais

Sou a chave de seu teorema
estratagema de sua ilusão;
e perdido entre o fim e o começo
sou o tropeço de sua aversão...

Sou a deixa que você supõe
desacerto maquiado de bom,
sou a túnica que cobre seu corpo
sou o gosto que tem seu batom...

Sou de longe o que de perto sente
o presente que você não previa,
sou ausência rimando; carência
sou muito mais do que você imagina.

Marçal Filho

Somos como as estações


Tem horas que os sentimentos
Passam por determinados momentos
Como se fossem cobertos pela sombra
Nos provocando certa escuridão
Que faz chorar o coração.
É como se a alma sentisse frio
Provocando intensos calafrios
Despertando uma carência
Pela saudade, pela ausência
Qual o motivo
Nem mesmo sabemos.
Nestas horas o sol perde o brilho
A flor mesmo bela não encanta
Nem o perfume dela se sente;
Nem mesmo a beleza presente
É capaz de transformar
A alma que está a chorar.
Como as estações
Assim são nossas emoções
Hora vivemos primaveras
Em outros longos verões
Porém também intensos invernos
E outono em outros momentos.


(Aut. Ataíde Lemos)

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

DESCOMPASSO


Tem dias que as horas passam
num tempo diferente do meu.
Às vezes escorrem tão lentas,
às vezes apressadas demais!

Tempo de descompasso,
de se caminhar aos pedaços,
vez por outra um tropeço,
e a menor fração do momento
é nada mais que um estilhaço
e quando percebo volto ao começo,
às vezes de forma bem lenta,
quase sempre apressado demais.

E o tempo vira um amontoado de escombros,
onde o poeta se inquieta,
e o verso se contorce no assombro
da pressa ou impaciência,
de não ter como brotar.

Tem dias que as horas passam
num tempo diferente do meu
e eu nem sei como evitar.


NALDOVELHO

QUEM INVENTOU O AMOR ?


Ponha suas mãos sobre as minhas...
Deixa eu admirar
essas formas suaves
Que seus dedos tem...
Deixa eu imaginar
Que nunca acaba...
Tenho em meu bolso
O papel que ontem
Você escreveu meu nome
e desenhou um céu...
E mais nada importa...
Fica um mundo inteiro de Histórias
para cuidar bem depois...
Ah!você pode ir...
Eu sei...
Eu não sei esperar...
Todos partimos...
Todos voltamos...

Mas nunca me mande
uma carta de adeus...
se um dia for...
que seja como a maré alta
que espantou os amantes...
mas ali deixou
conchinhas coloridas...

Lupi

A Canção da Saudade


Que tarde imensa e fria!
Lá fora o vento rodopia...
Dança de folhas... Folhas, sonhos vãos,
que passam, nesta dança transitória,
deixando em nós, no fundo da memória,
o olhar de uns olhos e a carícia de umas mãos.
Ante a moldura de um retrato antigo,
põe-se a gente a evocar coisas emocionais.
Tolda-se o olhar, o lábio treme, a alma se aperta,
tudo deserto... a vide em torno tão deserta
que vontade nos vem de sofrer mais!
Depois, há sempre um cofre e desse cofre
tiramos velhas cartas, devagar...
É a volúpia inervante de quem sofre:
ler velhas cartas e depois chorar.
Que tarde imensa e fria!
Nunca mais te verei... Nunca mais me verás...
Lá fora o vento rodopia...
Que desejo me vem de sofrer mais!

(Olegário Mariano)

Quem Sou Eu?


Eu sou a curva fechada
E a voz embargada
Sou o medo da derrota
E o final da anedota
Eu sou o vento frio
Que te provoca arrepio
Sou a água fervente
na sua dor de dente
Sou a pancada que acerta
Na ferida aberta
Sou o rosnar do cão
E a briga por um pão
Eu sou o relógio parado
E um cigarro apagado
Eu sou um purgante
No frasco de adoçante
Eu sou a vergonha de viver
E a vontade de beber
Eu sou a água imunda
Onde o barco afunda
Sou a pergunta repetida
E a verdade escondida
Eu sou a bula do remédio
E um dia de tédio
Eu sou aquilo que não presta
E tudo que te resta.


(TKM - Fogovivo)